Incêndio: a segurança em edificações é real? Parte 2
19/06/19 08h59
Em continuidade aos resultados da pesquisa do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), em relação a realidade da segurança contra incêndios nas edificações que apresentamos os primeiros dados em nossa publicação do dia 07/06/19; apresentaremos agora os resultados em dois sistemas distintos: sistema de iluminação de emergência e sistemas de chuveiros automáticos de supressão e controle de incêndio.
As dificuldades que usualmente são descobertas nos sistemas de proteção contra incêndio têm seu início nos projetos e especificações, se estendem para a instalação, onde se observam falhas risíveis (em sua maioria derivadas de dados contraditórios ou da falta de informações nos projetos) e chegam até a fase de uso da edificação, na qual são reiteradas as manutenções de forma equivocada ou inexistente e a operação insatisfatória; evidenciando aqui outro problema, que é a falta de treinamento e informação das equipes de gerenciamento.
A partir de agora, vamos apontar os resultados da pesquisa do LSFEx (Laboratório de Segurança ao Fogo e a Explosões) para os sistemas anteriormente citados.
ILUMINAÇÃO
Um dos mais importantes objetivos de um projeto de segurança contra incêndio em edificações é poder resguardar seus usuários, de maneira a proporcionar uma evacuação rápida, segura e organizada. Diante disso, o sistema de iluminação tem sua contribuição à medida que deve garantir a visualização dos trajetos a serem percorridos e dos impedimentos que devem ser evitados (deve ser auxiliado pela sinalização de emergência de orientação e salvamento). Para esse tipo de análise, se faz necessário levar em consideração que a alimentação elétrica do sistema de iluminação normal, entre outros, será desligada ou falhará em decorrência do incêndio, e que apenas as instalações e serviços de emergência permanecerão funcionais.
O sistema de iluminação segue a norma ABNT NBR 10898 que prevê que a iluminação de aclaramento é obrigatória para todos os locais que proporcionam a circulação vertical e horizontal de saída para o exterior da edificação. O sistema deve iluminar as rotas de fuga usáveis no momento da evacuação de uma edificação, no caso de um incêndio, e também deve permitir o controle visual das áreas abandonadas para que seja possível localizar pessoas impedidas de se locomoverem. A norma 10898 da ABNT prevê três tipos de sistemas de iluminação de emergência: conjunto de blocos autônomos, sistema centralizado com um banco de baterias recarregáveis e sistema centralizado com grupo motogerador.
O ponto com maior relevância negativa nos sistemas analisados (independente do tipo) foi o valor de iluminamento, no nível do piso, das toras de fuga e das escadas de emergência; conforme a ABNT 10898, nesses casos, é preciso garantir níveis de 5 lux para as escadas e de 3 lux para os locais planos. Em vários pontos dos locais analisados, o valor encontrado não estava dentro dos padrões exigidos. Esse cenário se explica, por quatro motivos preponderantes: número reduzido de luminárias de emergência instaladas; falha total ou parcial no acionamento das luminárias de emergência; baixa iluminância das luminárias de emergência; luminárias com má conformação do feixe de luz.
Outros fatores que agravaram ainda mais a situação desses sistemas foram que: de modo generalizado, tendo como referência o Projeto Legal havia luminárias que estavam instaladas em locais distintos dos indicados e pontos indicados de luminárias que não existiam. Além disso, averiguou-se nas avaliações de acionamento dos sistemas de iluminação de emergência que, em muitas áreas vistoriadas, diversas luminárias do sistema não atuaram ou atuaram demonstrando não apresentar o fluxo luminoso necessário para atender as condições de iluminamento no nível do piso, conforme definido anteriormente. Está situação se deve ao fato de as luminárias instaladas serem de má qualidade e requerem substituições frequentes afetando os três tipos de sistemas vistoriados, especialmente, aqueles compostos por blocos autônomos (que pela norma, devem ser vistoriados mensalmente).
Quanto ao tempo de autonomia dos sistemas, por regra, nenhum pode ter duração menor que uma hora, nas áreas analisadas, constatou-se que as luminárias não conseguiam se manter acessas após esse período seja por falta de carga em suas baterias internas, no caso dos blocos autônomos, ou por falha em seus componentes. Ainda sobre esse tipo de sistema de iluminação citado, verificou-se muitos instalados sobre as saídas, que apresentavam a inscrição da palavra SAÍDA ou de uma seta pintada em sua face translúcida.
Outro ponto que vale ser sinalizado, dentre os resultados da pesquisa do LSFEx, e que comprometeu os sistemas avaliados é o ofuscamento (as luminárias tem que ser instalados de forma a não causar ofuscamento aos olhos dos usuários). De acordo com a norma ABNT NBR 10898, a variação da intensidade da iluminação no piso não pode ser superior ao fator de 20:1; foram encontrados em diversos sistemas vistoriados variações que chegaram ao fator extremo de 55:1 (mais que o dobro permitido). Uma das conclusões que se pode chegar a partir desse estudo é a da falta de confiança dos sistemas de iluminação de emergência constituídos por blocos autônomos, por isso, a revisão da norma 10898 da ABNT para que limite a utilização desse sistema em edificações com grande concentração e fluxo de pessoas é imprescindível; além disso, há necessidade da norma particularizar e rotular mais adequadamente os sistemas; deliberar critérios de seleção do sistema a ser empregado; prever regras básicas relativas à lógica de operação dos sistemas; valorizar e determinar a necessidade de que todos os sistemas sejam objetos de projetos executivos, contendo inclusive os memoriais de cálculo e comprovações da efetividade do sistema; definir critérios de medição objetivos para a iluminação de balizamento e distingui-la adequadamente da iluminação de aclaramento; incluir procedimentos de aceitação técnica do sistema instalado, e incluir procedimentos de manutenção e de documentação que deve ser fornecida ao usuário do sistema, etc.
CHUVEIROS AUTOMÁTICOS
Os sistemas de chuveiros automáticos de supressão e controle de incêndio, assim como qualquer outro sistema de segurança e combate deve ter atuação ajustada com o grau de risco definido pela ocupação e características construtivas da edificação. Atua, de maneira integrada com outros itens como compartimentação horizontal e vertical, saídas de emergência, alarme de incêndio e hidrantes.
As avaliações realizadas pelo LSFEx passarma pelas seguintes etapas: verificação do projeto do sistema e suas especificações, verificação do atendimento do projeto nas instalações; investigação de procedimentos de comissionamento dos sistemas; realização de ensaios de operação/funcionamento; e verificação de registros associados à inspeção e manutenção. Todos os sistemas avaliados eram do tipo tubo molhado, com chuveiros automáticos do tipo spray.
Quanto ao projeto do sistema, notou-se com frequência que o projeto legal tem tomado o papel do projeto executivo. Trata-se de um erro grave do ponto de vista de implantação, pois o projeto legal tem apenas o objetivo de apresentar os subsídios técnicos básicos para a avaliação do Corpo de Bombeiros, enquanto que o projeto executivo, para esse caso em especial, deve apresentar um detalhamento aprofundado.
Em relação as avaliações, todos os sistemas vistoriados, sem exceção, apresentaram divergências entre projeto e memorial descritivo em relação aos chuveiros automáticos empregados nos ambientes; deficiência de especificações e referências técnicas dos componentes; carência de detalhes construtivos da instalação de equipamentos que unificam sua rede hidráulica; ausência de detalhes de instalação do medidor de vazão ou de meios para medição de vazão de bombeamento; e ausência de especificações técnicas em projeto para a sua aceitação técnica (esses pontos, prejudicam não só a aquisição de equipamentos, mas, também a implantação e manutenções).
Em relação aos itens empregados no sistema, notou-se, em especial, ao chuveiro automático, que os seguintes pontos afetam o seu desempenho operacional: em 55% (6 de 11) dos sistemas, as temperaturas de operação identificadas nos locais de instalação eram divergentes das definidas em projeto; em 55% dos sistemas a instalação dos chuveiros estava obstruída; em 45% (5 de 11) dos sistemas encontravam-se situações em que os chuveiros automáticos estavam instalados com orientação invertida em relação ao definido em projeto; em 45% dos sistemas o tipo de resposta do chuveiro automático encontrado no local de instalação era divergente do estabelecido em projeto. Enquanto foram realizados os ensaios operacionais nos comandos setoriais nos pavimentos das edificações vistoriadas, foi constatado em 55% (6 de 11) dos sistemas de chuveiros automáticos, a central de alarme de incêndio da edificação não sinalizava a operação destes comandos, apesar de estarem conectados a ela. Ainda, em 36% (4 de 11) das situações, as chaves de fluxo instaladas nos comandos setoriais ou os gongos hidráulicos instalados nas Válvulas de Governo e Alarme estavam danificadas ou com problemas em sua instalação. Estes ensaios operacionais demonstraram que 82% (9 de 11) das situações avaliadas apresentaram vazamentos nos componentes da montagem dos comandos setoriais (válvulas, conexões, chaves de fluxo, uniões, etc.). Já sobre os sistemas de bombeamento, constatou-se que em 73% (8 de 11) das situações avaliadas os ajustes das pressões de acionamento das bombas de incêndio estavam incompatíveis com os parâmetros definidos em projeto.
Em conclusão, verificamos que dos 11 sistemas verificados nenhum foi aprovado pela pelas atividades de aceitação técnica na norma ABNT NBR 10897. Ainda da importância sinalizada do sistema de chuveiros automáticos para a segurança contra incêndio das edificações, entende-se, pela quantidade de problemas levantados nas vistorias realizadas, que há a necessidade de ações mais sólidas para o progresso da conformidade na entrega técnica destes sistemas no Brasil. Lembrando que a avaliação da conformidade na instalação, do serviço prestado pelas empresas instaladoras, é tão importante quanto a qualidade do projeto entregue para sua realização, uma vez que o sistema que vai combater o incêndio é o que efetivamente está instalado na edificação.
Na regulamentação do Corpo de Bombeiros de São Paulo, foi integrado no texto da IT-23, o Anexo B, que sinaliza um check list para a aceitação técnica do sistema de chuveiros automáticos a serem implantados nas edificações e o Anexo C, correspondente ao check list para inspeção visual e ensaio do sistema de chuveiros automáticos que já estejam em utilização.
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